#NA PRIMEIRA PESSOA: TENHO MEDO DE LHE PASSAR A ANSIEDADE!
07 fevereiro 2017
Tive o primeiro ataque de pânico aos 20 anos, na rua, enquanto passeava com a minha mãe. Estávamos numa tarde de saldos de verão, aquele programa que todas as mulheres gostam de fazer e que faz bem ao ego. Acordei bem disposta, almocei bem e nada me fazia prever que subitamente no meio da rua o meu coração iria disparar loucamente e que fosse invadida por uma sensação de alienação da realidade e falta de ar. Pensei tratar-se de uma quebra de tensão, não conseguia colocar por palavras o que estava a sentir, a força escapava-me entre os dedos e os pensamentos planavam numa névoa. Pedi à minha mãe que fosse buscar um copo de água com açúcar. Minutos depois estávamos na farmácia para eu medir a tensão, tudo normal. Por despiste fomos ao hospital onde ouvi pela primeira vez a expressão "Ataque de ansiedade".
Os dias que se seguiram foram os piores até hoje, todas as noites ao deitar o meu coração entrava a galope na cama, não conseguia dormir, o ar parecia pesado, foram muitas as noites em que sai para a rua para apanhar ar no alpendre. Comecei a ganhar medo da noite, medo da morte, medo da hora de ir dormir, pois era quando o meu pior pesadelo chegava - comigo ainda acordada! Já contei aqui parte do processo até onde estou hoje, medicada, mas nem sempre estável, pois é uma doença matreira que arranja forma de contornar a medicação e o foco na recuperação. Quando menos esperamos surgem novos sintomas para que pensemos tratar-se de outra doença qualquer, ou simplesmente uma dor no peito mais forte do que as anteriores que nos conduz ao m.e.d.o. O medo e a ansiedade andam de mãos dadas, a ansiedade gera medo, o medo gera mais ansiedade, são um ciclo vicioso. O pior da minha vida.
Conviver com ansiedade tem-me conduzido nos últimos anos a pensamentos profundos sobre a infância. Fui incentivada a fazer psicanálise por uma amiga psicológa que me está sempre a encorajar a ir mais além, a não aceitar os 20mg diários de Escitalopram como cura, pois eles apenas servem para camuflar e não para curar. Por falta de tempo e também de vontade (por ir meter mais lenha na fogueira) ainda não avancei. Mas faço em casa a minha espécie de pré-tratamento, faço inúmeros exercícios de reflexão e quanto mais momentos vou recuperar ao passado, mais certezas tenho de que sofro de ansiedade desde a infância. Ela sempre fez parte de mim desde que tenho memória. Não sei se por ter estado 28 dias internada em estado grave com uma pneumonia aos 5 anos, onde fiz várias pulsões lombares e desenvolvi fobia a agulhas, se por medo do abandono (porque vi meninos serem abandonados lá) e ainda hoje detesto a solidão ou por ter sido traumatizante estar sem os meus pais durante várias noites. Odeio fazer análises, dão-me sempre direito a ficar deitadinha na maca 10 minutos para recuperar das tonturas. Por outro lado, talvez seja de mim, talvez tenha predisposição genética para a ansiedade. Desde a primária até á faculdade que fui acompanhada por agulhadas no peito. Talvez seja um “defeito” que nasceu comigo (ou não).
Um estudo apresentado no XXV Encontro Anual do Collegium International Neuro-Psychopharmacologicum em Chicago indica que, em parte, pode haver uma predisposição genética para desenvolver sintomas ansiosos e estima-se que entre 30 a 50% dos distúrbios de pânico estão ligados a causas genéticas oriundas da hereditariedade. Mais recentemente, a Organização Mundial de Saúde alertou em que os filhos podem herdar ansiedade ou depressão dos pais.
O estudo adianta também que “esses traços genéticos da ansiedade já podem ser identificados “tanto na infância quanto na adolescência”. Na maioria dos casos, pais e educadores ignoram essas manifestações ou simplesmente não estão preparados para reconhece-las ou identifica-las”.
Bom... e agora sou mãe, esta barriga ansiosa gerou um bebé bem disposto, que até hoje nunca nos deu problemas de comportamento. Durante a gravidez não precisei de medicação e pairou uma paz invulgar sobre mim, o chamado verdadeiro estado de graça. E, se por um lado sei que tive uma postura tranquila durante a gravidez e amamentação, por outro agora voltei à medicação e sou de novo uma mulher e mãe ansiosa a educar um ser humano. Sei o que é viver com ansiedade e espero que nunca aconteça ao meu filho. E, inevitavelmente, são vários os receios que tenho:
Como posso evitar passar-lhe ansiedade?
Sendo os filhos um reflexo dos pais, como o posso proteger da minha ansiedade à medida que ele ganha perceção das coisas?
Como podemos detetar a ansiedade nas crianças? Quais são os sintomas?
As respostas a estes perguntas vou deixar para um próximo post em conjunto com a Psicóloga Irina Vaz Mestre.